Resumo
O ácido glutâmico é um dos aminoácidos não essenciais mais abundantes na natureza. Em sua forma de glutamato livre, ele proporciona o gosto Umami, que é único e distinto dos outros quatro gostos básicos (salgado, doce, amargo e azedo). Por ser capaz de melhorar o sabor dos alimentos, ele é amplamente utilizado pela indústria. A forma mais comum de utilização do gosto Umami pela indústria é através da adição do glutamato monossódico (MSG), um realçador de sabor classificado na categoria mais segura de aditivos alimentares. Existem muitas pesquisas científicas que apontam que o aminoácido glutamato, além de melhorar o sabor dos alimentos, promove uma série de benefícios importantes à saúde.
Glutamato: componente natural dos alimentos
O ácido glutâmico (ou glutamato na sua forma ionizada) é um aminoácido não-essencial encontrado naturalmente em muitos alimentos e em organismos vivos. Este aminoácido está presente nos alimentos nas formas ligada (como componente das proteínas) e livre. Em sua forma livre, o glutamato é detectado por receptores gustativos e proporciona o quinto gosto básico Umami, que em japonês significa “delicioso”.
Muitos alimentos são fontes naturalmente ricas em glutamato livre e possuem o gosto Umami. Tomates (Figura 1), milho, ervilha e carnes em geral estão entre os principais exemplos (Ninomiya, 1998; Yamaguchi & Ninomiya, 2000), além de alimentos maturados que sofrem reações de hidrólise protéica, como queijos e presuntos (Figuras 2 e 3).
FIGURA 1 - VARIAÇÃO DA CONCENTRAÇÃO DE GLUTAMATO DURANTE O AMADURECIMENTO DO TOMATE ( VEJA NO PDF ABAIXO )
(Adaptado de Ninomiya, 1998)
FIGURA 2 - EVOLUÇÃO DE GLUTAMATO LIBERADO DURANTE A MATURAÇÃO DO QUEIJO CHEEDAR ( VEJA NO PDF ABAIXO )
(Adaptado de Weaver & Kroger, 1978)
FIGURA 3 - EVOLUÇÃO DE GLUTAMATO LIBERADO DURANTE A MATURAÇÃO DO PRESUNTO CURADO ( VEJA NO PDF ABAIXO )
(Adaptado de Cordoba et al, 1994)
Além disso, o leite materno é uma importante fonte de glutamato livre (Figura 4) (Davis, 1994). O gosto Umami é uma das primeiras sensações percebidas pelo paladar humano, sendo reconhecido pelo paladar de bebês como um importante indicador da presença de proteína nos alimentos.
FIGURA 4 - AMINOÁCIDOS PRESENTES NO LEITE MATERNO ( VEJA NO PDF ABAIXO )
(Davis, 1994)
Glutamato monossódico: benefícios para a indústria de alimentos
Além de estar presente naturalmente nos alimentos, o glutamato é empregado frequentemente pela indústria de alimentos como realçador de sabor (Jinap & Hajeb, 2010).
A forma mais comum de utilização é através do glutamato monossódico (sigla em inglês: MSG - monosodium glutamate), que é o sal sódico do aminoácido ácido glutâmico. Quando adicionado aos alimentos, o MSG possui o mesmo papel sensorial do glutamato livre de ocorrência natural, pois a única diferença entre a molécula de ácido glutâmico e de MSG é o sódio (Figura 5). Ao ser dissolvido em água (presente nos alimentos e na saliva), o MSG se dissocia, libera glutamato livre e confere mais Umami, realçando e harmonizando o sabor de caldos, sopas, molhos, embutidos cárneos, entre outros.
FIGURA 5 - ESTRUTURAS MOLECULARES DO ÁCIDO GLUTÂMICO E DO GLUTAMATO MONOSSÓDICO. ( VEJA NO PDF ABAIXO )
O MSG é produzido atualmente através da fermentação de açúcares – principalmente oriundos da cana-de-açúcar e do milho. Esta tecnologia, desenvolvida no Japão em 1956, foi aprimorada ao longo dos anos e continua sendo empregada atualmente (Sano, 2009).
A atuação do MSG como promotor de Umami pode também ajudar a indústria de alimentos a desenvolver produtos com teor reduzido de sódio. Sua contribuição positiva para o sabor permite reduzir sódio sem comprometer demasiadamente o perfil sensorial dos alimentos. O MSG possui apenas 1/3 da quantidade de sódio presente no cloreto de sódio (ou sal de cozinha).
Yamaguchi & Takahashi (1984) avaliaram a aceitabilidade de sopas com menor teor de sódio. Verificaram que com aproximadamente 0,4% de MSG (variando a concentração de NaCl de 0,4 a 1,2%) houve um aumento da aceitabilidade da sopa, possibilitando reduzir sódio sem comprometimento do sabor (Figura 6).
FIGURA 6 - AVALIAÇÃO SENSORIAL DE SOPAS COM DIFERENTES DOSAGENS DE SAL (COM E SEM GLUTAMATO) ( VEJA NO PDF ABAIXO ).
(Yamaguchi & Takahashi, 1984)
Glutamato monossódico é seguro
O glutamato monossódico é um dos aditivos alimentares mais estudados pela comunidade científica em todo o mundo e seu uso em alimentos não oferece riscos à saúde.
O MSG está classificado como um aditivo GRAS pelo FDA/EUA (FDA, 2006) e com IDA (Ingestão Diária Aceitável) não estabelecida pelo JECFA (FAO/WHO, 1988). No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária do Brasil (ANVISA) se baseia nos estudos realizados pelo JECFA e FDA e não estabelece restrições para a utilização do MSG pela indústria de alimentos, por considerá-lo seguro.
A segurança do uso do MSG se tornou controversa a partir de publicações que relacionavam o seu consumo a supostos efeitos adversos à saúde humana, conhecidos principalmente através do “Complexo de Sintomas Relacionados à Ingestão de Glutamato Monossódico” (ou “Síndrome do Restaurante Chinês”) e da “Obesidade Hipotalâmica” (Kwok, 1968; Monno et al, 1995; Hermanunssen et al, 2006; He et al, 2008). Como resultado, ao longo de décadas o MSG tem sido objeto de avaliações quanto a sua segurança de uso por parte de diferentes Comitês Científicos e/ ou Agências de Regulamentação e centros de pesquisa em renomadas universidades.
Para verificar a veracidade da relação do MSG com a Síndrome do Restaurante Chinês, Geha et al (2000) realizou um estudo duplo-cego placebo controlado que descartou esta relação, pois os indivíduos participantes do estudo que relataram ter reações após a ingestão de MSG tiveram respostas ambíguas, sem nenhuma reação adversa grave.
Contudo, os fabricantes sugerem recomendações tecnológicas 0,1-0,8% no alimento pronto para consumo, uma vez que o gosto Umami, em excesso, compromete a aceitação sensorial dos alimentos (Beyreuther et all, 2007; Jinap & Hajeb, 2010).
Com relação aos estudos que relacionaram o MSG à obesidade, verificou-se que a maioria utilizou doses extremamente altas de MSG, por via injetável, o que não reflete a realidade da utilização do MSG como aditivo alimentar. O último estudo conclusivo foi publicado por Shi et al (2010), na China, e descartou esta relação, pois o MSG utilizado como aditivo alimentar dificilmente supera concentrações de glutamato presente naturalmente nos alimentos. Além disso, a obesidade depende de diversos fatores, incluindo tipo de alimentação, atividade física e fatores genéticos.
Benefícios do glutamato
Além de sua importância tecnológica para a indústria de alimentos, o MSG promove alguns benefícios à saúde humana, conforme sugerem pesquisas científicas. Após a confirmação da presença de receptores específicos para o glutamato na língua, estômago e intestino (Chaudhari et al, 1996 e 2001; Maruyama et al, 2006; Niijima, 2000), verificou-se que além da melhora na sensibilidade do paladar, o glutamato pode estimular uma variedade de atividades através de receptores presentes também no trato gastrointestinal. Zolotarev et al (2009) verificou que o MSG pode detectar precocemente a presença de alimentos de natureza protéica, estimulando a liberação de suco gástrico e hormônio pepsinogênio em cães.
Já Akiba et al (2009) verificou que o glutamato protege a mucosa gástrica contra a ação de microorganismos, como o Helicobacter pylori, pois estimula a liberação de muco protetor, reforçando a defesa da mucosa gástrica. Toyomasu et al (2010) verificou que o MSG estimula a motilidade intestinal e acelera o esvaziamento gástrico em cães, o que se torna um benefício para a digestão.
Baldeon e Flores (2011) sugeriram que o glutamato, principal substância que confere o quinto gosto, influencia diretamente no desenvolvimento imunológico, intestinal e na saciedade dos recém-nascidos nos primeiros anos de vida.
Outros benefícios associados ao gosto Umami foram publicados por Tomoe et al (2009), que verificaram evoluções no quadro de idosos hospitalizados após a ingestão de alimentos com MSG, pois este aumenta a secreção salivar, que protege a mucosa oral do ressecamento e de infecções e ajuda na digestão de alimentos protéicos. Os idosos também apresentaram uma melhora no estado nutricional, aumento a imunidade e o bem estar.
No Brasil, Elman et al (2010) realizaram um estudo para verificar os benefícios do Umami em crianças com câncer, submetidas a tratamentos quimioterápicos. Concluíram que a utilização do MSG nas preparações pode contribuir para melhorar a aceitação alimentar das crianças em tratamento quimioterápico, devido à capacidade de aumentar a palatabilidade e auxiliar na manutenção ou melhora do estado nutricional.
Conclusão
A comunidade científica e a indústria de alimentos têm um papel fundamental na divulgação destas informações e no esclarecimento geral da sociedade sobre as aplicações das substâncias Umami nos alimentos.
Além de seguro, o glutamato monossódico pode contribuir para a melhoria da alimentação e da qualidade de vida da população.
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