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DEFICIÊNCIA DE MICRONUTRIENTES NO BRASIL: EVIDÊNCIAS ATUAIS


A deficiência de micronutrientes afeta cerca de um terço da população mundial e está fortemente relacionada à carência de ferro, iodo e vitamina A. Entretanto, desde o final da última década, outros componentes passaram a ter destaque no âmbito da saúde pública, incluindo vitamina D, zinco e ácido fólico[1].

Os grupos que se encontram em situação mais vulnerável são as crianças menores de seis anos, gestantes, nutrizes e lactentes, pelo aumento das demandas nutricionais nestes momentos biológicos. Apesar das deficiências serem marginais, elas prejudicam o desenvolvimento máximo do potencial humano. De modo geral, o estado carencial entre as crianças resulta em retardo do crescimento, subdesenvolvimento físico e mental e aumento da mortalidade. Dentre os adultos, as maiores consequências são letargia, diminuição da capacidade física e reprodutiva, declínio da função cognitiva e debilidade imunológica[1,2].

Nesse sentido, fica claro concluir que a carência de micronutrientes é fator impeditivo para o desenvolvimento econômico e social de comunidades e grandes nações. Por outro lado, medidas de intervenção que visam o controle e a prevenção de déficits nutricionais podem reduzir tanto a morbidade como a mortalidade, além de promover desenvolvimento físico, neurológico e avanço intelectual[2,3].

Para tanto, a magnitude da deficiência de cada um dos micronutrientes precisa ser definida com o propósito de se estabelecer intervenções e políticas públicas apropriadas para as necessidades das diferentes populações[3].

Revisão sistemática: um retrato do panorama nacional

Com o objetivo de verificar a prevalência de deficiência de micronutrientes na América Latina e Caribe (LAC) desde o ano 2000, um grupo de pesquisadores do Instituto de Nutrición y Tecnología de Alimentos (INTA), da Universidade do Chile, conduziu uma revisão sistemática entre Julho de 2011 e Abril de 2012. Adicionalmente, o grupo examinou os dados disponíveis sobre deficiência de folato e vitamina B12 desde 1990[3].

As bases de dados sobre deficiências de vitaminas e minerais da Organização Mundial da Saúde (OMS) e Nutrinet.org foram consultadas para acessar as últimas Pesquisas Nacionais de Saúde (PNS) de cada um dos países da região. As informações foram complementadas por meio de dados obtidos nos sítios eletrônicos dos Ministérios da Saúde e/ou Institutos Nacionais de Estatística. Além disso, foi realizada uma busca por artigos publicados nas bases Pubmed, LILACS e SciELO, onde combinações de cada um dos micronutrientes e nome de todos os países da LAC em espanhol, português e inglês foram inseridas como termos chaves. Inquéritos nutricionais também foram incluídos como indicadores da situação, mas apenas quando não existiam dados provenientes de biomarcadores bioquímicos.

Após aplicação dos critérios de exclusão, inclusão e eliminação de artigos duplicados, os pesquisadores obtiveram o total de 496 documentos, incluindo 25 PNS para toda a região estudada. Com relação ao Brasil, foram identificados 78 estudos e 1 PNS, realizada em 2006, que permitiram melhor compreensão da magnitude da deficiência de micronutrientes no país.

Resultados por micronutrientes

VITAMINA C

Um estudo conduzido no Brasil com 117 gestantes apontou 31% de deficiência de vitamina C (<0.65 mg/dl). Outra investigação envolvendo gestantes mostrou deficiência de 40% entre aquelas que fumavam e 27% entre as que não faziam uso de tabaco[3].

O ácido ascórbico possui uma variedade de funções vitais, incluindo a hidroxilação do colágeno, síntese de neurotransmissores, absorção do ferro e proteção contra danos oxidativos[3,4].

Em 2012, uma pesquisa envolvendo 58 adultos obesos sugeriu 9% de deficiência de vitamina C (<0.3 mg/dl). Os estudos mencionados devem ser interpretados apenas individualmente, já que não existem dados representativos sobre o nível de vitamina C para subgrupos populacionais no Brasil[3].

Vitamina A

A vitamina A é essencial para o crescimento e desenvolvimento humano, sendo que sua deficiência pode causar cegueira em crianças e aumentar o risco de mortalidade devido à infecções. Entre as gestantes, a carência do nutriente causa cegueira noturna e pode elevar o risco de mortalidade materna[1,3]. Além disso, observa-se alta prevalência de anemia em populações afetadas pela deficiência de vitamina A, já que o nutriente está envolvido na patogênese da doença por meio de diferentes mecanismos biológicos: modulação do metabolismo do ferro, interferência na imunidade e mobilização do ferro dos tecidos[5].

De acordo com os resultados da PNS realizada no Brasil, que avaliou os níveis de vitamina A de 3.499 crianças em idade pré-escolar, 17% apresentaram deficiência da substância (retinol sérico <20 μg/dL), sendo 18% na região urbana e 13% na rural[6].

A mesma pesquisa reportou 12% de deficiência de vitamina A em mulheres (n=5.698), sendo que a prevalência foi superior entre as mais jovens (15 a 19 anos) quando comparadas às mais velhas (36 a 49 anos), 15% e 13% respectivamente.

Outros estudos realizados no país apontaram 21% de deficiência de vitamina A entre lactentes, de 0% a 75% no grupo pré-escolar, de 21% a 35% nos escolares, de 2% a 32% entre adolescentes, de 8% a 9% em adultos, 2% em grupos de gestantes, 28% entre recém-nascidos e 10% entre idosos[3].

Segundo o critério estabelecido pelo International Vitamin A Consultative Group (IVACG/WHO) para definir a gravidade da deficiência de vitamina A no âmbito da saúde pública, o Brasil é classificado como nível moderado de severidade, conforme mostram as figuras 1 e 2[7].

(COLOCAR AQUI A FIGURA 1 E 2)

VITAMINA D

Não existem dados representativos sobre os níveis de vitamina D entre os subgrupos populacionais no Brasil. Entretanto, a interpretação individual de vários estudos disponíveis sugere que a insuficiência do nutriente pode ser maior entre mulheres, idosos e mulheres na pós-menopausa[3].

A inadequação do nutriente é muito bem ilustrada pelos resultados do The Brazilian Osteoporosis Study (Brazos), na qual a ingestão média de vitamina D em um grupo de adultos e idosos, e outro de adolescentes saudáveis foi respectivamente de 74 UI e 144 UI — em contraposição à dose diária recomendada pelo Institute of Medicine (IOM) de 400 – 600 UI ao dia[9]. No Brasil, a Ingestão Diária Recomendada (IDR) para adultos permanece 200 UI. Quanto às concentrações séricas, os valores encontrados na população brasileira são semelhantes àqueles observados na Europa e Estados Unidos. Níveis inferiores a 75 nmol/L, que caracterizam insuficiência, formam vistos em 62% dos adolescentes. Idosos institucionalizados (36 nmol/L) e ambulatoriais (49 nmol/L) também apresentaram concentração média reduzida[10].

Outra pesquisa conduzida com idosos demonstrou que 82% a 94% dos indivíduos apresentavam níveis de 25-hidroxi-vitamina D (25 OHD) inferior a 70nmol/L[3].

Vale lembrar que os resultados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2008-2009 reforçaram os dados sobre a alta prevalência de inadequação de ingestão de vitamina D[11]. O levantamento demonstrou 99,6% de inadequação entre homens (19 e 59 anos) e 99,2% entre mulheres da mesma idade. Em indivíduos com mais de 60 anos, o número foi superior a 99%. Entre crianças e adolescentes, os índices também se mostraram bastante elevados.

As únicas amostras populacionais representativas na América Latina sobre os níveis de vitamina D foram observadas no México e na Patagônia Argentina. As duas regiões foram classificadas como prevalência moderada de insuficiência do nutriente, conforme mostra a figura 3[3].

(COLOCAR AQUI A FIGURA 3)

VITAMINA B6

A vitamina B6 atua como cofator enzimático e está relacionada ao metabolismo de aminoácidos e hormônios esteróides, à síntese do heme e de neurotransmissores, à integridade do sistema imune, dentre outras funções vitais[3,4]. Resultados de um único estudo sugerem que a deficiência de vitamina B6 (<20 nmol/L) pode ser alta entre as mulheres (54%). A pesquisa envolveu 1032 indivíduos (38 ± 10 anos), sendo que os dados não devem ser extrapolados para a população brasileira em geral[3].

Ferro

A deficiência de ferro afeta negativamente o desenvolvimento neurológico de crianças, aumenta a morbi-mortalidade de gestantes e recém-nascidos e reduz o rendimento do trabalho físico em adultos. A carência do nutriente pode resultar em anemia, doença caracterizada pela diminuição da capacidade de transporte de oxigênio pela hemoglobina (Hb). A anemia também pode ser causada por deficiência de folato e vitamina B12, doenças hematológicas, inflamações e infecções[3,2,5].

O trabalho de revisão sistemática realizado pelos pesquisadores do INTA apontou 5 estudos que sugerem que o grau de anemia entre gestantes e mulheres em idade fértil no Brasil pode variar de normal a severo. Dentre elas, 3 resultaram em prevalência de anemia com gravidade moderada[3].

De acordo com os resultados da PNS e dados da OMS, a severidade da anemia no âmbito da saúde pública pode ser considerada moderada entre mulheres de 15 a 49 anos (29%)[6,8].

(COLOCAR AQUI A FIGURA 4)

Além disso, a OMS estima que metade de todas as anemias na região seja causada pela deficiência de ferro. A organização afirma ainda que a prevalência de anemia por deficiência de ferro nos países em desenvolvimento é 2,5 vezes maior que outros tipos de anemia.

A revisão sistemática mostrou que a anemia é classificada como um problema severo de saúde pública entre as crianças brasileiras. Do total de 68 estudos identificados sobre o tema, 19 resultaram em prevalência moderada (entre 20% e 39,9%) enquanto que 39 observaram prevalência severa da doença (≥40%)[3].

FOLATO e VITAMINA B12

O folato e a vitamina B12 compartilham funções na metilação do DNA e síntese de ácido nucleico. Baixos níveis de folato em mulheres em idade fértil aumentam o risco para defeitos no tubo neural. A deficiência de vitamina B12 está associada a problemas hematológicos e neurológicos em adultos[3,4].

Um estudo realizado em 1992 no Brasil, que verificou os níveis de nutrientes em gestantes, sugeriu que 44% dos indivíduos apresentavam deficiência de folato e 0% de vitamina B12[3].

Uma investigação mais recente (2003) concluiu que 37% de 74 gestantes sofriam deficiência de folato. Entretanto, os valores não podem ser extrapolados para a população, já que o país não possui dados representativos para cada um dos subgrupos vulneráveis.

Não foram observados estudos que averiguaram a adequação de folato após a publicação da Resolução RDC nº 344 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), que tornou obrigatória a fortificação de farinhas de trigo e de milho com ferro e ácido fólico, a partir de junho de 2004.

ZINCO e COBRE

Informações obtidas pelos pesquisadores do INTA sugerem que 30% a 50% das crianças latino-americanas apresentam risco de ingestão inadequada de zinco[3]. O mineral participa ativamente dos processos metabólicos, sendo que sua deficiência está associada a múltiplas alterações fisiológicas[4].

No Brasil, não existem dados representativos para os diferentes grupos populacionais com relação aos níveis de zinco e cobre. Entretanto, o resultado de uma pesquisa que verificou o estado nutricional de crianças em idade escolar (7 a 15 anos) vulneráveis socioeconomicamente, mostrou que a deficiência de zinco era de 7% (meninas <60 μg/dL e meninos <65 μg/dL)[3].

O mesmo estudo apontou 4% de deficiência de cobre entre meninas (< 65 μg/dL) e 3% entre meninos (<70 μg/dL). O cobre é considerado um elemento traço essencial para a eritropoiese, além de atuar como cofator enzimático[4].

IODO

Foram detectados 3 diferentes estudos no Brasil conduzidos com crianças em idade escolar para verificar os níveis de iodo[3]. Um deles, realizado em 2010, apresentou 0% de deficiência do mineral em uma amostra de 300 crianças (excreção urinária <100 μg/L). Outra pesquisa, publicada em 2004, avaliou as concentrações de iodo na tireoide e na urina de 844 jovens (6 a 14 anos) e apontou 0% de deficiência. A ausência de deficiência do mineral foi confirmada ainda pelo projeto Thyroid Mobil.

O iodo é fundamental para o desenvolvimento do sistema nervoso central e prevenção de cretinismo e bócio. A carência do mineral está associada à redução da capacidade educacional, diminuição da produtividade e vulnerabilidade econômica e social[3,4].

TIAMINA

Em 2010, uma investigação sobre beribéri envolvendo 103 índios da região norte do Amazonas demonstrou uma prevalência de 10% de deficiência de tiamina (28-85 ng/ml)[3].

A POF 2008-2009 constatou prevalência de inadequação da ingestão de vitamina B1 entre jovens e adultos brasileiros[11]. Os casos mais significativos foram entre homens e mulheres com 60 anos ou mais (44% e 47% respectivamente) e entre homens e mulheres de 19 a 59 anos (31% e 38% respectivamente). A prevalência de inadequação também foi alta entre os jovens de 14 a 18 anos (28% meninos e 27% meninas).

Considerações Finais

A revisão sistemática realizada pelo INTA concluiu que o Brasil necessita de um número maior de pesquisas envolvendo amostras representativas dos subgrupos populacionais para melhor compreensão da magnitude da deficiência de determinados micronutrientes. As informações são fundamentais, especialmente entre os grupos mais vulneráveis.

A implementação de políticas públicas e programas de suplementação eficazes que visam a prevenção e o controle de deficiências nutricionais são imprescindíveis.

Os custos envolvidos no tratamento e no gerenciamento das consequências da deficiência de micronutrientes, sejam eles medidos em termos humanos ou econômicos, são extremamente elevados. Por outro lado, os valores necessários para a prevenção de carências nutricionais são consideravelmente baixos.

Nesse sentido, as ações governamentais e os investimentos em nutrição são plenamente justificáveis, pela redução de despesas com saúde, aumento da produtividade e consequente crescimento econômico e social.

A Royal DSM é uma empresa global de cunho científico, atuante nos mercados de saúde, nutrição e materiais. Ao aliar suas competências únicas em Ciências da Vida e Ciências dos Materiais, a DSM contribui para a prosperidade econômica, progresso ambiental e avanços sociais, agregando valor sustentável para todos os seus públicos interessados. A DSM oferece soluções inovadoras que nutrem, protegem e melhoram o desempenho em mercados.

Em 2012 comemoramos os 100 anos da descoberta das vitaminas. As vitaminas desempenham um papel essencial para a saúde, o bem-estar e a prevenção de doenças, sendo fundamentais para a solução de desafios nutricionais ao longo de nosso ciclo de vida.

Neste ano, a DSM e a Sight and Life lançaram a campanha Vitamins in Motion (Vitaminas em ação), uma iniciativa para aumentar o conhecimento e defender o acesso às vitaminas para todas as pessoas que necessitam ser saudáveis e bem nutridas. Nossa campanha, transforma avanços científicos e tecnológicos em soluções nutricionais para benefícios de saúde.

A DSM é líder nesses desenvolvimentos e está comprometida em realizar avanços adicionais para as futuras gerações, ajudando a melhorar a qualidade de vida, através de vitaminas, minerais e ingredientes funcionais, com soluções personalizadas para cada produto e público alvo.

Referências

[1] Food and Agriculture Organization of the United Nations. Food-based approaches for improving diets and raising levels of nutrition. Concept Note. Roma, Dec 2010.

[2] Kennedy G, Nantel G, Shetty P. The scourge of “hidden hunger”: global dimensions of micronutrient deficiencies. Food, Nutrition and Agriculture. 2003, 32: 8-16.

[3] de Romaña DL, Olivares M, Brito A, Cediel G, Mujica M. Prevalence of micronutrient deficiencies in Latin America and the Caribbean. Technical Report. Instituto de Nutrición y Tecnología de Alimentos. Santiago, 2012.

[4] Philippi ST. Pirâmide dos alimentos. Fundamentos básicos da nutrição. Barueri: Manole, 2008.

[5] Oliveira MA, Osório MM. Consumo de leite de vaca e anemia ferropriva na infância. J Pediatr (Rio J). 2005;81: 361-7.

[6] Ministério da Saúde. Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher. Brasil, 2006.

[7] WHO. Global Database on Vitamin A Deficiency in Brazil. Geneva, World Health Organization, 2006.

[8] WHO. Report of a joint WHO/UNICEF/UNO expert consultation. Iron deficiency anaemia: assessment, prevention and control. A guide for programme managers. Geneva: WHO, 2001.

[9] Pinheiro MM, Schuch NJ, Genaro PS et al. Nutrient intakes related to osteoporotic fractures in men and women – The Brazilian Osteoporosis Study (BRAZOS). Nutrition Journal; v.8, n.6, p.1-8, 2009.

[10] Saraiva GL et al. Prevalence of vitamin D deficiency, insufficiency and secondary hyperparathyroidism in the elderly inpatients and living in the community of the city of São Paulo, Brazil. Arq Bras Endocrinol Metabol; 51(3):437-42. 2007.

[11] Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa de orçamentos familiares, 2008-2009 (POF): análise do consumo alimentar no Brasil. Rio de Janeiro, 2011.

[12] Institute of Medicine. Dietary Reference Intakes for Calcium and Vitamin D. Washington, D.C.: National Academies Press, 2010.

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